Um vento frio empurra uma folha de jornal contra as arcadas do Cais do Sodré. Jaime segura-a e rasga um pedaço em forma de ilha. Lança-a pelo ar e o papel segue pela Rua do Alecrim, recortado aqui e ali pela luz dos letreiros que povoam a noite de apelos, embate na escada de ferro que atravessa uma ruela, hesita por instantes permitindo a Jaime alcançá-lo de novo, desce de encontro a uma porta e a um caixote de lixo e eleva-se num voo ziguezagueante à altura da placa do Passport Dancing, embaraça-se nas pernas de um marinheiro que nem repara nele, para ilha lhe basta por certo o seu navio, desliza entre caixotes com couves murchas, vira para a Rua Nova do Carvalho, passa pelo grupo que diante do Tokio ouve um homem de fato castanho com o emblema do Benfica ao peito, que o pontapeia levando-o a refugiar-se no passeio e a continuar entre os saltos altos de um travesti que abraça um candeeiro como se o achasse o mais sedutor dos amantes e embate num táxi que com o motor ligado aguarda diante de um bar e depois pára, imóvel apesar do vento, junto da porta metálica onde está escrito Lusitano no centro de um arco-íris.”
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