O que é uma visão? O que a distingue da percepção e da imagem comum? Essencialmente, o facto de não só dar a ver um espaço e um tempo não presentes com a fulgurância e a presença do presente, mas de vir desse espaço, de lhe pertencer e de ver ela própria, encerrando em si o saber do todo que aparenta. A visão vê, por isso pode ser profética ou anamnésica. É o ritmo, a pulsação e a aceleração que transformam as imagens em visões.
Capaz de revelar uma visão no trajecto de uma folha no ar ou um sonho na mínima percepção de qualquer coisa, o Livro do Desassossego é o grande tratado das visões do século xx; a poesia heteronímica nasce do funcionamento de máquinas rítmicas que produzem certas visões; e os escritos nacionalistas, proféticos e esotéricos, constroem, interpretam e projectam visões poderosas. Toda a obra de Fernando Pessoa se tece à volta de ritmos e visões.