Retrato, entre outras coisas, do artista enquanto jovem, o último romance que Vladimir Nabokov escreveu em russo (publicado em folhetim em 1938 e em inglês em 1963), O Dom, é considerado por muitos um dos maiores romances russos — e anglo-saxónicos — do século XX. Tem, no centro do seu puzzle narrativo, a literatura russa (VN, Prefácio) do século XIX, Puchkin, Gogol, Tchékhov, a par da visualização nabokoveana do processo criativo e da afirmação do talento artístico, da peregrinação urbana e do monólogo joyceano, do maléfico jogo de espelhos borgeano da realidade e da ficção, da sedução duma autenticamente moderna história de amor, do pessoano trauma dos mundos perdidos, etc… A primeira leitura transforma-se rapidamente em releitura, porque, como também disse VN, o leitor não é um carneiro e nem todas as penas o tentam.
Carlos Leite