Um homem caminha primeiro a pé, tacteando no escuro, depois de automóvel, conduz toda a noite, dorme na pressa de um hotel, retoma a viagem primeiro ainda em terras portuguesas, depois em Espanha.
Em Sevilha sobe ao último andar de um prédio. Tem a chave da porta, a casa está desarrumada e nela se encontram duas crianças adormecidas quase entre sinais de abandono.
«Aproximei-me da cama maior. O rapaz tinha apenas as cuecas vestidas. Magro, as pernas esguias, o cabelo comprido. Ouvia-se a respiração. Rápida, regular, entrecortada por pausas de onde emergia com uma aspiração sufocada. Da outra cama, não se ouvia nada. A menina estava despida, com o cabelo espalhado pelo rosto e as pernas cobertas com a ponta do lençol. Apoiei-me nas grades, debrucei-me e afastei-lhe o cabelo. Não se mexeu. Respirava devagar, com os lábios entreabertos e um quase insensível movimento do peito. Parecia fria, apesar do calor, o corpo contraído, a cabeça colada aos joelhos. Tinha os lençóis húmidos em redor das coxas. Na penumbra, a sua pele esbatia-se contra o tecido branco.»
Este é o início de uma história inesperada, dura, com o «esplendor das coisas ameaçadas».