«O autor deste livro prossegue como melhor lhe apraz, é um piloto num voo de reconhecimento, e no seu diário de bordo o mapa regista uma geografia tão variável que desconcerta. Agora sobrevoamos um pico alpino, viramos a página e já voamos sobre o mar, mais outra página e é campo aberto, e depois um deserto, e um estuário, e uma selva, e os arranha-céus iluminados de uma metrópole; e se primeiro fazia um sol esplendoroso que permitia distinguir nitidamente a paisagem, de repente embrenhámo-nos por entre as nuvens; é a nebulosidade da dúvida, porque surgiu uma dúvida ao piloto, e por nossa vez somos assaltados pela dúvida. E ainda bem, porque às vezes o sol em demasia cega-nos; antes a dúvida, é mais fecunda. É um voo vagabundo, como é vagabundo o pensamento, ou como é vagabunda a rêverie, que todavia, como sabemos, possui uma lógica inflexível.»
Do Prefácio de Antonio Tabucchi