«A atenção prestada em Henrique IV — Parte II ao quoti- diano popular articula-se com a maior importância adquirida pela figura de Falstaff, quando comparada com a sua presença em cena na Parte I. Como é afirmado num texto crítico recente, nas cenas de Falstaff, Shakespeare “dramatiza uma história social da outra Inglaterra — com as suas tabernas, os seus bordéis e as suas quintas” (Bulman 169). No que respeita a tabernas e bordéis, a primeira parte já nos tinha dado a imagem de uma vida social, centrada na figura de Falstaff, caracterizada pela venalidade e pela libertinagem, mas que ao mesmo tempo era equilibrada pela representação de um mundo despreocupado e folgazão, por vezes carnavalesco, numa espécie de projecção imaginária de uma velha e alegre Inglaterra, uma “merry England” que épocas mais recentes tendem a vislumbrar no período isabelino mas que, enquanto imaginário de um tempo sempre já passado, Shakespeare localiza aqui no período de Henrique IV, cerca de dois séculos antes do seu próprio tempo. Nesta segunda parte, contudo, deixa de se notar aquele equilíbrio, com os pratos da balança a penderem agora para a apresentação de um mundo que mais aparece como um submundo.»
Da Introdução